Uma rua sem nome
Rompe o dia e desperto de um sono tranquilo. Levanto-me, dirijo-me à janela do quarto e afasto o cortinado que encobre, muito ao de leve, a luz vinda do exterior. O sol parece espreitar, meio escondido, através de nuvens brancas.
Observo as árvores que resistem ao tempo num terreno bravio bem perto de mim. Contemplo a serra que se avista ao longe e respiro o ar fresco da manhã. Há um misto de cores que entram pelo meu quarto, bem cedinho, ao acordar. O verde dos montes que se funde com o castanho da terra e o céu que vai limpando, deixando transparecer o azul que lhe é fiel.
Caminho até à sala, abro a janela de par em par e respiro o cheirinho a pão quente que vem da pastelaria do outro lado da rua. Tem bolos fresquinhos de fabrico caseiro. Por cima da lojinha do pão, janelas semiabertas deixam a descoberto cortinados coloridos que ondulam com a brisa matinal.
Um autocarro pára junto da escola acima da minha rua. Vejo carros que passam e estacionam junto ao passeio, outros que seguem viagem. Consigo escutar gargalhadas infantis no átrio e a campainha de entrada para as aulas acaba por tocar.
Há vozes que se cruzam na rua por entre passos, uns apressados outros vagarosos. Os cães ladram ao longe, ouvem-se disparos de espingarda em época de caça.
Ergo o olhar e avisto o castelo da cidade que conhece tão bem as minhas raízes. Estão guardadas num canteiro de flores.
De um dos lados da casa, inalo o aroma que a natureza me oferece. Do outro, sinto o cheiro a movimento numa rua que se cala a cada fim de semana.
Fecho a janela, abstraio-me do ruído da vida lá fora e deixo-me ficar no silêncio do lar.
A campainha quebra o meu momento repousante, abro a porta mas não vejo ninguém. Há um envelope lacrado perdido no chão.
(Texto escrito para a Fábrica de Histórias)