Às vezes, de noite, subo ao telhado do sótão, sento-me a ver as luzes da cidade e o frenesim do fim dos dias e penso que gostava de ficar ali para sempre. O meu sótão é cor de rosa. Leonor Teixeira, a Ametista
Às vezes, de noite, subo ao telhado do sótão, sento-me a ver as luzes da cidade e o frenesim do fim dos dias e penso que gostava de ficar ali para sempre. O meu sótão é cor de rosa. Leonor Teixeira, a Ametista
Quero ficar contigo, apenas de vez em quando. Isso basta-me. Porque o de vez em quando pode ser para sempre e o sempre, para mim, é muito pouco. Porque encurta-se a vida, nos anos expostos nos relógios que se apressam na demora de viver.
Pois eu já cumpri essa parte, já vivi, e o que sobra é tão pequeno. Dizem-me as horas que é preciso acabar num instante, para depois seguir viagem na solidão que nos transporta ao mistério do lugar.
E tu, tu és o meu instante.
P.S. Faltas-me. Faltas-me nesse sorriso que te cala e no silêncio que te move.
Agora que cheguei à minha praia e sinto, mais do que nunca, a imensidão da tua ausência posso perceber o quão ridícula se pode tornar uma paixão, quando vivida por uma das partes num êxtase total.
Já não é hora, não para mim.
Aqui penso melhor, a minha capacidade de discernimento é maior, a racionalidade acentua a meus pés e eu consigo reflectir com mais clareza, é tudo tão mais suave, mesmo que me pese na alma. De que vale um bater de coração por um outro que se dispersa em outras paragens?
Quem sou eu para mudar o curso da vida de alguém?
O fim de tarde é ameno, o sol bate-me no rosto docemente, o vento envolve-me na sua plenitude mas continuo a sentir o cheiro do vazio e o meu coração, de tão pequeno que ficou, bate descompassadamente e eu fumo cigarro atrás de cigarro, perco-me nas palavras e tento inalar o iodo que não me chega.
Que é isso do amor, que não existe, e que surge de uma paixão, aquele sentimento desmedido, qual nuvem passageira que se desfaz perto dos céus.
Espero-te de qualquer maneira. Espero-te na ânsia de te viver agora, porque não sei se existe o amanhã e eu, eu que morro a cada despedida, não posso alimentar-me do futuro, daquele cada vez mais incerto, mais incógnito.
Sinto a paz por aqui, está tudo tão sereno.
Queria que chegasses de surpresa, de mansinho. Pudesse eu lançar-me nos teus braços, como uma criança indefesa que sente protecção num abraço.
Mas tu não estás.
E como poderias estar, se eu não te faço aproximar? Não sei, não consigo, sou verdadeira demais para tentar manipular-te, os jogos de sedução não são para mim, o que se sente diz-se e guarda-se. Guarda-se com os momentos, os gestos genuínos, o silêncio no olhar. Há beleza maior do que duas pessoas olharem-se sem palavras? E os sorrisos na imensidão dos corpos que se calam? Conseguem ser esquecidos? Não, não para mim.
São demasiados cigarros, alguns martinis, mas o gemido do mar não é alucinação, existe. Se o ruído desvanecer, o cantar das ondas dar-se-á nas madrugadas. Há alento maior? Talvez o uivo dos lobos no ínfimo das montanhas ou o grito dos corvos que passam, inesperados, em qualquer lugar do mundo onde haja azul celeste.
Podes esquecer-te (como te compreendo) mas como não poderei lembrar-te, a ti, que entraste com avisos que tentei ignorar e que se perpetuaram (maldita expressão, nada é eterno)?
Lembro-te desde Setembro, acredita. Lembro-te, como se fosse hoje, desse brilho no olhar naquela noite plena de Verão, durante a melhor festa a que se pode assistir, ou que se consegue viver.
Já ninguém fica para olhar as estrelas, já ninguém fica para ouvir o cantar do mar.
Mas eu fico, estou aqui, a escutar o ondular das marés nas madrugadas a chorar.
Quando estou contigo sou feliz. Mas baralhas-me os sentidos, tu. E neste tumulto que me agarra a ti, esperarei até que me prendas ou me largues. Definitivamente.