Palavras para uma imagem - Notebook, a minha versão
Ele e ela dirigiam-se a casa depois de uma agradável ida ao cinema. O filme a que tinham assistido tinha-lhes transmitido um estado de alma intenso. Caminhavam em silêncio e, ao aproximarem-se do semáforo que cruzava a rua principal da cidade com uma outra qualquer, ele deu-lhe a mão e puxou-a para junto de si. Ficaram tão perto um do outro que os seus lábios quase se tocaram. Naquele instante, o sinal estava vermelho e ele convidou-a para dançar.
Sem música?, perguntou ela em tom de timidez. Eu canto para ti, respondeu ele e, num gesto lento, enrolou-a de encontro ao peito conduzindo-a até à estrada. A rua estava deserta, o silêncio era de ouro. Observaram o semáforo passar a verde enquanto davam início a uma dança na estrada. Ele cantarolava qualquer música lenta enquanto os seus corpos se enlaçavam na mais perfeita harmonia. O sinal mudou de cor, passou de verde a laranja, a dança parou, olharam-se de perto e deitaram-se na estrada, lado a lado. As suas mãos cruzaram-se enquanto o vermelho do semáforo despontava, olharam as estrelas, identificaram cada uma delas sobre um chão frio que refrescava os seus corpos quentes, ávidos de aventura. Perderam a noção do perigo, permaneceram deitados sob um céu que deixava mostrar uma lua prateada, autêntica confidente de um momento que não queriam que acabasse.
O sinal passou a verde, sentiram um carro aproximar-se a alta velocidade e levantaram-se rapidamente. Saltitaram até ao passeio, as mãos continuavam dadas enquanto automóveis vindos de longe passavam apressados. Abraçaram o semáforo que ia mudando de cor, soltaram gargalhadas e voltaram a tocar-se numa dança lenta em redor do sinal de trânsito. Os risos deram lugar a sorrisos ternurentos.
Sentiam-se livres para desafiar o destino. O amor entre eles nascia agora, por entre um perigo e uma aventura que se encontravam entre o proibido e o devido. Era urgente permanecerem no intermitente, um intervalo que deixava o tempo parar e guardar nas folhas de um diário uma paixão que começava a ganhar as cores de um qualquer semáforo de rua.
(Texto escrito para a Fábrica de Histórias)