Palavras para uma imagem - Espelho
Por onde andas, Duarte? Deixei de te ver, já não lembro o teu rosto, não reconheço o teu cheiro, desconheço quem és. Apenas recordo a tua voz.
Deixaste-me aqui, do lado de cá do espelho da vida, sozinha num mundo que já não me pertence, sem cor, sem brilho. Porque partiste? Pedi-te para ficares e tu insististe em ir e não voltar. Como irei continuar sem ti? A dor é demasiado grande, recuso-me a viver assim.
Deixas-me ir para junto de ti? Há um lugar a teu lado guardado para mim, não há? Eu sei que esse lugar existe, sinto que é meu, necessito urgentemente de alcançá-lo. Dá-me um sinal. Preciso de ti, mesmo que longe da vida que me foi oferecida e que agora renego.
Sabes? Esperei-te durante largos anos, sonhei-te como nunca imaginei ser possível, vivi-te como ninguém. Depois de conquistar-te a vida levou-te de mim, arrancou-me de ti, quebrou o que construí de nós.
Para lá do espelho há flores, amor da minha vida? Imagino um lugar sereno, um campo verde onde anjos flutuam de branco. Seremos nós? Acredito que sim. Não vivemos a mais bela história de amor? Não foi a nossa alma rasgada por um amor impossível que sobreviveu a um mundo hostil e que conseguimos ultrapassar em segredo? Em segredo, verdade. Lembras-te? Talvez por isso o destino não nos tenha proporcionado a libertação da nossa paixão.
Não respondes. Continuas aí, em silêncio, frente a um espelho prestes a quebrar, um espelho inventado para nós e que tem sido uma barreira que teimou em ficar. Vejo-te do lado de lá, de costas viradas para ti próprio, longe de mim, perto de um mundo que não conheço. E eu continuo a amar-te, impossível substituir-te. Ainda espero por ti, aguardo a cada minuto dos meus dias que tu surjas, vindo do outro lado do espelho, de braços abertos.
Tenho de confessar-te. Sinto necessidade de fazê-lo. Gritar ao mundo que foste a razão do livro que escrevi, das telas que pintei, das músicas que dancei, do lugar onde fiquei. E senti-te perto, tão perto, mas perdi-te na altura em que acreditei que a nossa história poderia ser eterna. Acabei por encerrar a minha vida como se fosse uma folha de um diário e não virei a página.
O meu amor por ti está declarado no livro que escrevi para ti e tu não leste. Está aí, junto ao espelho que ergueste, entre quem és e quem gostarias de ter sido.
Tua até sempre.
Laura
(Texto fictício escrito para a Fábrica de Histórias)