Esquecer, renascer
Um dia, quero morrer contigo.
Quando subires aos céus e chegares às estrelas, perto do sol e da lua, quero estar a teu lado para, finalmente, renascer.
Hoje a minha alma jaz na velha casa em ruínas, outrora nossa, o meu corpo vagueia pelas ombreiras das portas. As janelas batem nos parapeitos com o vento que sopra voraz, das prateleiras empoeiradas caem os livros antigos que lemos, são iguais às nossas vidas. Há folhas que se soltam do diário da nossa história, espalham-se pelo chão que range a cada passo que dou. É como as horas dos dias que nos pertenceram, perderam-se num momento intemporal.
E eu abandono-me. Abandono-me silenciosamente, fujo do passado em direcção incerta, alcanço o barco onde navegámos sem rumo e que morre agora em terra firme depois da procura de um rio que corre turvo. Não consigo tocar nas suas águas, parecem bolas de neve que se desfazem ao passar.
Recuso-me respirar, suspiro como que pela última vez, sinto-me perto do que não cheguei a conquistar. Onde ficaste, alma que se perdeu por atalhos obscuros, em estradas sem saída? Até no final se repete o desencontro, o nosso, como duas sombras que se cruzam, desconhecidas.
Apagam-se as luzes, desvanecem as cores, tudo se torna escuro e tu ficas fantasma da velha casa. Eu, parto solitária no instante em que te esqueço e caminho numa nuvem que desceu à terra.
Por enquanto, estou viva.