Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

O meu sótão é cor de rosa

Às vezes, de noite, subo ao telhado do sótão, sento-me a ver as luzes da cidade e o frenesim do fim dos dias e penso que gostava de ficar ali para sempre. O meu sótão é cor de rosa. Leonor Teixeira, a Ametista

O meu sótão é cor de rosa

Às vezes, de noite, subo ao telhado do sótão, sento-me a ver as luzes da cidade e o frenesim do fim dos dias e penso que gostava de ficar ali para sempre. O meu sótão é cor de rosa. Leonor Teixeira, a Ametista

Cartas de (des)amor

Love-letter.jpg

 (Imagem retirada de: google imagens)

 

Fui lendo as histórias que retirei do baú de recordações, minhas e tuas, que guardei no tempo que foi nosso. Li e reli, inventei e imaginei, construí e revivi.

Foram castelos de sonho que criei, desenhei-os na areia da minha praia mas levou-os o mar, o meu mar azul, em noites de tempestade.

Enquanto te amar, ouvirei sempre a mesma música. Quando ela deixar de tocar, esqueci-te para sempre.

 

in "O Despertar dos Silêncios"

por Leonor Teixeira, a Ametista

Mudar de vida, viver com um sonho

 

Há sonhos que se lembram por breves instantes e há os que ficam para sempre.

Laura recorda-se de um sonho que teve, talvez o mais sombrio de todos os que traz na memória. Ou o mais desejado, porque consegue ser um pouco feliz ao revivê-lo.

Todas as manhãs, bem cedinho, um denso nevoeiro encobria os raios de sol que incidiam, pálidos, sobre uma floresta encantada que guardava uma pequena cabana desabitada, feita de ébano.

Por entre as folhas vermelhas e douradas caídas sob numerosos plátanos e faias que se beijavam Laura percorria os caminhos, os cantos e recantos daquele lugar sedutor. Descalça e envolta num manto branco, parava à porta da cabana e ouvia um choro de criança mas não conseguia entrar. Um corvo cantava por perto, deitava-se num suspiro, e um lobo uivava ao longe pelo dia que acabava de nascer. Tudo lhe parecia misterioso mas mágico.

Presas aos troncos mais robustos baloiçavam cartas de amor, imensas, umas dela outras de Duarte. Um dia, na alvorada, pegou em duas delas, tocou-as numa carícia e leu-as em voz alta a olhar para o céu por entre os ramos. Teve uma sensação etérea, algo surreal, do tão genuínas que eram as palavras que ficaram.

'Ainda hoje me declaro a ti como se fosse morrer amanhã, confesso-me nestas folhas de papel que vou amarrotando a cada linha que encho de letras. Tenho medo que não me oiças se tas disser, por isso escrevo na esperança de que me leias e talvez assim consigas sentir e perceber, finalmente, a razão do meu silêncio. Porque é assim que te amo. Em silêncio. Laura.'

'E é assim que eu te sonho. A passeares pela floresta, descalça e vestida de branco, a correr até à única toca que nos sorri e eu a encolher-me no teu colo para nos escondermos naquele sítio tão pequeno e secreto, tão nosso e demasiado longe da vida real. Sei que ficarás para sempre nesse bosque e é assim que te lembro. Duarte.'

Laura queria permanecer entre a verdade e a mentira, a saudade e a ausência dos momentos como uma boneca de cera, sem alma nem coração. Queria deixar-se estar, inerte, envolta em folhas de papel onde as palavras não cabiam, entre canetas e lápis que não escreviam. Com livros, muitos livros em branco e cartas de amor vazias que se espalhavam pela floresta encantada, onde o sol desmaiava nas manhãs e o nevoeiro angustiava o cair das noites.

Sentiu-se despertar debaixo de um abeto branco, o único no meio do extenso arvoredo. A seus pés, uma lamparina dourada brilhava, começava a ganhar vida e transformou-se. Um feiticeiro surgiu, com rosto de lobo e asas de corvo, sorriu-lhe e disse: 'A minha filha nasceu ontem e eu dei-lhe o teu nome'.

 

Laura não voltou a vê-lo.

 

 

(Texto escrito para a Fábrica de Histórias)

por Leonor Teixeira, a Ametista

O vazio dos lugares

 

Querido Duarte,

 

O meu amor adormecido despertou, o seu sono inquietou-se, o meu coração afligiu-se ao escutar, à distância, a melodia agridoce da tua voz.

Ausência, senti, uma vez mais como tantas outras nestes últimos quatro anos. Já não sei quem és, pensei, e perguntei-me que foi feito de ti porque não te reconheço. Eu, que esperei por ti todas as horas dos meus dias como se em algum momento fosses voltar. Procurei-te em todos os lugares, imaginei encontrar-te por aí, vi-te surgir nos atalhos.

Sabes? Era a minha ilusão de ver-te chegar a cada instante que me fazia acreditar que irias regressar. Mas tu não estavas. Nem aqui, nem ali, nem perto nem longe, nem em lado nenhum. Simplesmente não estavas.

Eu quis crer que era engano este meu sentimento tão imenso, quase inimaginável, cheguei a acreditar que era mentira este desejo imensurável de querer-te a meu lado, de poder respirar-te, de viver-te. Mas era verdade, era real, tão real que sentia a alma rasgar a cada pensamento de ti. E definitivamente tu não estavas, nunca estiveste. Silêncio, apenas silêncio. Perdi-te no silêncio do (re)encontro; (des)encontro.

Vêm-me à memória lembranças de nós, abraços sentidos e palavras de amor, gestos que não voltaram a repetir-se, jamais se repetirão.

...punhas as mãos na minha cintura, enrolavas-me no teu peito e dizias 'gosto de ti'. Eras tão bonito...

Fui lendo as histórias que retirei do baú de recordações, minhas e tuas, que guardei no tempo que foi nosso. Li e reli, inventei e imaginei, construí e revivi. Foram castelos de sonho que criei, desenhei-os na areia da minha praia mas levou-os o mar, o meu mar azul, em noites de tempestade. Amo-te, dizia baixinho a cada adormecer como se estivesses sempre a meu lado.

Hoje voltei a sentir o pulsar frenético do músculo que me permite respirar, foi intenso o seu disparo que abalou o seu compasso. Tarde, demasiado tarde. Vão, tudo em vão. As horas, os dias, os meses, os anos. A espera.

Quis devorar o mundo, a terra e os céus. Quis aniquilar este amor, esta paixão (sei lá) e renascer das cinzas. Deixei de saber quem sou e onde pertenço, perdi-me na turbulência dos sentidos e fugi de ti, de todos e de mim.

O sonho ruiu, o meu, de mim, de ti, de nós. Desmoronou-se, como um castelo de areia que se desfaz na maré vaza. E eu, em que me transformei? Em sombra, apenas em sombra.

 

Ficou vazio o teu lugar. E o meu.

 

Laura

 

 

por Leonor Teixeira, a Ametista

Post-Scriptum

...

 

Mais ninguém conseguirá preencher o lugar que te pertence. Adoro-te a ti.
Tua até sempre.

 

Laura

 

P.S. Fechei, há algumas horas, o envelope onde ficou guardada esta carta que escrevi em Dezembro de há dois anos. Quis pô-la na caixa de correio mas evitei, talvez porque te reencontrei ontem e senti que não são apenas aquelas as palavras que queria deixar-te. Algo me deteve porque há mais, muito mais, e é tanto o que quero dizer-te que a caneta treme na minha mão, por entre os dedos que nunca ousaram tocar-te diante das multidões.

Queria escrever-te mais uma carta, uma outra que não esta, mas prefiro acrescentar em post-scriptum o que o meu coração dita e como dança a minha alma mas, desta vez, sem falar de corações destroçados, de sentimentos desencontrados. Queria escrever-te uma carta, sim, mas diferente, construída de palavras doces e coloridas, sem mágoas nem lágrimas.

Não quero contos sobre confissões do que senti por ti, dos gritos silenciosos de um amor que durou demasiado tempo, tanto que não sei quanto. Não quero histórias que ficaram entre o partir e o ficar, sem princípio, meio e fim.

Sabes? Gostaria de falar-te de outras coisas. De sonhos, de desejos, de fantasias que foram preenchendo as horas dos meus dias.

Gostaria de falar-te da beleza que ficou por descobrir, dos passeios que ficaram por concretizar, do tanto que tivemos por inventar, das coisas mais simples da vida que deixámos por partilhar.

Queria dizer-te, até, que poderíamos ter alcançado o inatingível. Sabes que através dos sonhos tudo se torna possível? O nosso imaginário consegue chegar até onde a nossa alma nos levar. E tudo se torna tão bonito.

Posso contar-te que, juntos, já caminhámos à beira mar numa praia deserta, contemplámos o por de sol num fim de tarde de verão sentados na areia. Mergulhámos, lado a lado, numa onda branca e conseguimos tocar os mais belos corais no fundo do mar. Depois de admirarmos um mundo de mil cores onde conseguimos absorver o irrespirável, nadámos encostados um ao outro até à superfície dos oceanos. Para lá das águas cristalinas, sentimos o sol de um dia acabado de nascer que encheu de luz o nosso o rosto.

Lembras-te da nossa dança na praia? Aquela que ficou por inventar? Conseguimos ondular os nossos corpos e enlaçámo-nos numa agitação lenta dos sentidos. Em redor de nós, a melodia do mar cruzou-se com o cântico das gaivotas e, antes de partirmos, desenhámos o nosso nome na areia. Sabes? Ainda sinto o sabor a sal que ficou na nossa pele.

Juntos, percorremos estradas limpas e frescas, caminhámos de mãos dadas devagar por entre montes e vales, subimos colinas, saltámos nas pradarias. No final, descansámos abraçados debaixo de uma árvore no bosque secreto que guardou os nossos beijos. Consegues sentir o aroma das flores campestres? Tenho uma guardada nas páginas do livro que escrevi para ti.

Gostaria de falar-te do quanto acreditei que tudo poderia ser possível. Da esperança de ver-te chegar com uma rosa vermelha na mão e um brilho no olhar. Dos teus braços abertos para me levarem até ao mais alto dos rochedos e, de lá, admirar contigo a mais sublime das paisagens. Das semanas a viver-te por completo, dos meses de partilha, dos anos a teu lado com sorrisos.

Queria pegar nas palavras que te escrevi e declamar-tas num poema eterno. Queria recitar-te, num cenário de neve a cair numa noite de Dezembro, o que a minha alma viveu por nós.

Gostaria finalmente de confessar-te neste meu post-scriptum que, ao reencontrar-te, senti confiança. Era isso que queria dizer-te, mas perdi-me na fantasia das palavras e deixei-me levar pelo sonho.

Fica a última parte, a essencial e que pretendo fazer chegar até ti num manifesto impetuoso, pela injustiça angustiante do que nos foi destinado. É a declaração da coragem que sinto emergir do mais fundo do meu ser e me rasga as entranhas. Coragem para gastar a minha voz num grito e exclamar, de coração aberto, que renasceu a minha capacidade de lutar. Lutar, mas desta vez, por mim. Porque agora, mais do que nunca, quero recuperar a minha liberdade. A de ser feliz.

 

Concedes-me esse direito?

 

Laura

 

 

(Texto escrito em 9 de Dezembro de 2009, agora alterado e adaptado para a Fábrica de Histórias)

por Leonor Teixeira, a Ametista

Palavras para uma imagem - O velho do mar

 

Meu querido velho do mar,


No último fim de tarde sombrio de Setembro, quando morreste, saí de casa como sempre fiz todos os dias da minha vida mas, daquela vez, de corpo inerte. Carregava no rosto a marca dos anos e a angústia de uma espera incessante de ti, tu, que já não podias voltar.

Sentei-me junto ao cais da praia que sempre me ofereceu as melhores recordações da nossa juventude inacabada, que se perdeu nos tempos pelo amadurecer das idades.

O nevoeiro aproximou-se denso e frio como sempre fora e tanto me confortava a cada entrada das noites. A meu lado sentou-se a saudade, minha eterna confidente do passado, que trazia consigo aquela dor nostálgica que me acompanhou ao longo das décadas e se transformou, no momento em que partiste, numa aflição assustadora por nunca mais te poder ver.

Sabes? Era àquele lugar que eu ia sempre à mesma hora e onde me despedi de ti no mais triste entardecer a que se assistiu, disfarçado pela beleza da paisagem, ao lançar às águas frias do teu mar a última carta de amor que me deixaste. Nela ficaram escritas as tuas palavras derradeiras, agarradas à ausência tão própria de um homem dos oceanos, e onde dizias que não podias ser meu porque tu eras do mar e ele pertencia-te a ti, preenchia os teus minutos e mais nada nem ninguém poderia ocupar o seu lugar.

Lembro-me de ouvir falar de ti quando já não estavas, meu velho do mar. Chamavam-te o aventureiro solitário das marés, do tanto que desafiaste tempestades ao comando do navio que foi só teu. Era muito mais do que isso, era o teu lar, o teu recanto, a tua vida. Foi a tua verdadeira morada, tão e apenas tua. A pedra preciosa que amavas sem qualquer condição.

Recordo-me dos pescadores da aldeia contarem as tuas histórias sem se cansarem, ao redor de uma mesa da taberna da areia. Eram histórias plenas de aventura, falavam dos teus regressos de cada viagem, quando atracavas no porto e os abraçavas com uma força extrema pela alegria de voltar. E eu ouvia os contos que eram só teus, sabia-os de cor porque estava sempre lá, escondida entre os rochedos, à espera de ver-te chegar.

Eras um guerreiro, sobrevivias a qualquer intempérie e apesar de seres um homem marcado pelas estações, pelo sol ardente dos verões e o frio cortante dos invernos, eras dono de uma alma nobre, fiel ao teu mar e nada te detinha.

Sei que deixaste escritos pedaços das viagens em que embarcaste, descrições comoventes das tuas paragens por lugares distantes e onde ficaram retratados os teus sorrisos de cada vez que ancoravas num país qualquer. Foste guardando de uma forma memorável a força das amizades que construíste em terra firme e os adeus marcados pelo soltar das amarras.

Contam que eras solitário pela perda de um grande amor e pela lealdade que juraras ao teu navio, companheiro dos teus dias e afago das tuas noites. Seria eu o grande amor que deixaste para trás para te dedicares ao encanto e assombro dos oceanos? Sinto que sim, ou que talvez.

Nunca ninguém soube o teu verdadeiro nome, nunca o revelaste, e naquela noite em que uma águia sobrevoou circundante as dunas para lá da aldeia da praia, o teu navio naufragou na mudança das marés e o teu corpo nunca foi encontrado. Dizem que ficou junto aos mais belos corais, perto de um tesouro sem dono, no fundo do mar.

E eu quis soltar as amarras que me prenderam ao cais que te pertenceu e que ainda hoje é teu. E desejei adormecer sobre o navio onde moraste, lá, nas águas que navegaste por entre as brumas e em que, tantas vezes, mergulhaste na tentativa de respirar o impossível e onde agora descansas.

Os fins de tarde ficaram para sempre, tardes submersas onde jaz o teu corpo, pelas âncoras que agarraste e levaste contigo bem presas à tua alma de aventureiro solitário das marés.

Tua até sempre

 

M.
(a velha do cais)


 

(Texto fictício escrito para a Fábrica de Histórias)

 

imagem cedida para a Fábrica de Histórias por: Jerónimo Afonso

por Leonor Teixeira, a Ametista

Pedido sem sentido

 

Querido Duarte,

 

Ontem, pediste-me para ficar. Mas eu saí apressada, na minha condição de não voltar. Caminhei sem rumo, perdi-me nas horas. Sentei-me junto ao rio que passa no jardim onde deixei guardados pedaços da minha felicidade. Lá, bem perto do céu, senti a luz do sol afagar-me o rosto ao mesmo tempo que a chuva caía sem cessar sobre o meu corpo. O vento insistiu em trazer consigo as palavras que disseste antes de partir. Gosto de ti, sussurraste. Mas eu saí sem olhar para trás. Esqueci o beijo que não demos, aquele que me pediste baixinho mas que não conseguiste roubar-me. Lembras-te?

'Não me afastes assim da tua vida'.

Sabes? As palavras também nascem, crescem, vivem e morrem.

E a chuva e o vento persistem em ficar.

 

Laura

 

por Leonor Teixeira, a Ametista

Reencontro

 

Querido Duarte,

 

Queria escrever-te mais uma carta mas, desta vez, sem falar de corações destroçados, de sentimentos desencontrados. Queria escrever-te uma carta, sim, mas construída de palavras doces e coloridas, sem mágoas e lágrimas.

Não quero histórias sobre confissões do que senti por ti, dos gritos silenciosos de um amor que durou demasiado tempo, tanto que não sei quanto. Não quero histórias que ficaram entre o partir e o ficar, sem princípio, meio e fim.

Sabes? Gostaria de falar-te de outras coisas. De sonhos, de desejos, de fantasias que foram preenchendo as horas dos meus dias.

Gostaria de falar-te da beleza que ficou por descobrir, dos passeios que ficaram por concretizar, do tanto que tivemos por inventar, das coisas mais simples da vida que deixámos por partilhar.

Queria dizer-te, até, que poderíamos ter alcançado o inatingível. Sabes que através dos sonhos tudo se torna possível? O nosso imaginário consegue chegar até onde a nossa alma nos levar. E tudo se torna tão bonito.

Posso contar-te que, juntos, já caminhámos à beira mar numa praia deserta, contemplámos o por de sol num fim de tarde de verão sentados na areia. Mergulhámos, lado a lado, numa onda branca e conseguimos chegar perto dos mais belos corais no fundo do mar. Depois de admirarmos um mundo de mil cores onde se respira natureza pura, nadámos de mãos dadas até à superfície dos oceanos. Para lá das águas cristalinas, sentimos o sol de um dia acabado de nascer que nos iluminou o rosto. Lembras-te da nossa dança na praia? Aquela que ficou por inventar? Conseguimos ondular os nossos corpos e enlaçámo-nos numa agitação lenta dos sentidos. À nossa volta, o som do mar cruzou-se com o cântico das gaivotas e, antes de partirmos, desenhámos o nosso nome na areia. Sabes? Ainda sinto o sabor a sal que ficou na nossa pele.

Juntos, percorremos estradas limpas e frescas, caminhámos devagar por entre montes e vales, saltámos nas pradarias. No final, descansámos abraçados debaixo de uma árvore no bosque secreto que guardou os nossos beijos. Consegues sentir o aroma das flores campestres? Tenho uma guardada nas páginas do livro que escrevi para ti.

Gostaria de falar-te do quanto acreditei que tudo poderia ser possível. Da esperança de ver-te chegar com uma rosa vermelha na mão e um brilho no olhar. Dos teus braços abertos para me levarem até ao mais alto dos rochedos e, de lá, admirar contigo a mais sublime das paisagens. Das semanas a viver-te por completo, dos meses de partilha, dos anos a teu lado com sorrisos.

Queria pegar nas palavras que te escrevi e declamar-tas num poema eterno. Queria recitar-te, num cenário de neve a cair numa noite de dezembro, o que a minha alma viveu por nós.

Gostaria finalmente de confessar-te que, ao reencontrar-te, senti confiança. Coragem para gastar a minha voz num grito e exclamar, de coração aberto, que renasceu a minha capacidade de lutar. Lutar, mas desta vez, por mim. Porque agora, mais do que nunca, quero recuperar a minha liberdade. A de ser feliz. Concedes-me esse direito?

 

Laura

 

por Leonor Teixeira, a Ametista

As Pontes de Madison County - a minha versão

20119562.jpg

 

'Meu querido Robert,

 

Se esta carta chegar até ti, estejas onde estiveres, não farei já parte desta vida. Terei embarcado numa outra viagem, aquela que tu já conheces. Levo-te comigo no coração e procurarei por ti até te encontrar.

Escrevo-te para agradecer a história de amor que vivemos, aquela que sempre quis ter e que só tu me conseguiste proporcionar.

Lembro-me, como se fosse hoje, do dia em que chegaste às colinas de Iowa no teu velho Chevrolet. Trazias o ar rude dos anos marcado no rosto, mas um sorriso leal e um olhar terno.

Lá estava eu, no alpendre de madeira da quinta, a respirar mais uma tarde escaldante de Verão. Tu, um fotógrafo da National Geographic aventureiro e de alma nómada, vinhas em busca das pontes que povoam Madison County.

Senti-te perdido e ensinei-te o caminho. Levei-te a conhecer a ponte Roseman, onde ficaram as marcas daquele que foi o início inesperado da nossa história de amor.

Contigo, descobri que o amor existe na sua verdadeira essência. Contigo, aprendi a amar. Ensinaste-me que quando os sentimentos são puros e os gestos delicados, a nossa vida transforma-se e tudo parece perfeito.

Contigo, consegui elevar os meus sentidos mais profundos e que desconhecia ter. Juntos conseguimos partilhar duas vidas e vivê-las de uma só vez. Contigo, a minha vida ganhou brilho.

Recordas-te da nossa dança? Lembro-me do teu olhar quando surgi dentro do vestido que usei só para ti. Tocámo-nos tão suavemente que conseguíamos escutar o palpitar dos nossos corações. Vivemos dias de uma beleza tão rara que quase me pareceu um sonho.

Estou-te grata por isso. Pelo teu carinho, pelo teu amor, pelos dias em que foste o meu verdadeiro companheiro.

Sei que andas por aí, quem sabe por perto.

Recebi a caixa que me enviaste com todos os retratos que tiraste, todas as fotografias que captaste, todas as imagens que gravaste. Trouxe tudo comigo. O crucifixo que te dei naquele fim de tarde na pradaria, o álbum e as palavras que me dedicaste. Ainda trago comigo o teu cheiro, está gravado na minha pele.

Acredita que, se estivéssemos vivos, largaria tudo e iria ao teu encontro. Depois da morte do meu marido procurei por ti, mas não consegui encontrar-te. 

Após o meu desaparecimento, os meus filhos tiveram dificuldade em aceitar a  nossa história mas, depois de tantas descobertas, deram-me todo o apoio emocional que alguma mãe pode ter.  Consegui senti-lo, ao longe. Senti lágrimas correrem pelos seus rostos ao lerem a mais bela história de amor que alguém pode viver.

Passei todos estes anos com o peso da traição e nunca poderia abandonar a minha família. Apesar de um matrimónio quebrado pelo silêncio e uma indiferença vindos de há longo tempo e quase insuportáveis, não poderia ir na tua direcção. Não conseguiria deixar para trás os meus dois filhos.

Aquele dia chuvoso em que partiste para sempre foi o mais marcante da minha vida. Não consigo esquecer o teu gesto, aquele em que colocaste o crucifixo que te dei no espelho retrovisor do teu velho Chevrolet, enquanto esperavas por mim. Por momentos, que me pareceram tão longos quanto a dor de uma perda, senti-me entre o  partir e o ficar. Estive prestes a sair e chamar por ti, lançar-me nos teus braços e deixar-me ir.

Deste-me a maior prova de amor que alguém pode dar e eu acabei por ficar. Porque não podia partir. Nunca conseguiria ser feliz na sua plenitude, mesmo que a teu lado. Compreendes-me?

Não voltei a ver-te. Separámo-nos mas estivemos sempre juntos, porque os nossos corações uniram-se no dia em que nos conhecemos e ficaram ligados até à morte.

Pedi aos meus filhos a minha cremação. Concretizaram o meu desejo e lançaram as minhas cinzas às águas do rio que passa por baixo da ponte Roseman. Naquele lugar estão guardados segredos nossos, pedaços da nossa felicidade.

Hoje procuro por ti, procurarei até que me seja permitido. Quero ver-te chegar, reviver o nosso amor, viver a nossa história inacabada. E acredito que conseguirei encontrar-te, porque sinto que também tu procuras por mim.

Até breve, meu amor.

 

Eternamente tua

 

Francesca'

 

 

(Texto escrito para a Fábrica de Histórias)

por Leonor Teixeira, a Ametista

Carta a quem não lê

 

'Querido Duarte,

 

Sei que não me lês, sei que não entras no meu espaço.

Por isso confesso que não te esqueci, amor da minha vida presente.

Declaro aqui, neste meu mundo, que és tu que existes em cada momento imaginário do meu dia a dia.

Às vezes, vejo-te passar. Finjo que ignoro a tua presença, finjo que me és indiferente, mas és tu quem faz parte dos meus sonhos.

Sei que o tempo vai passar e nada vai mudar. Sabes, meu amor, bastava-me aquela conversa que nunca tivemos e sinto que jamais teremos. Mas as palavras permanecem guardadas num cantinho de mim, à espera do momento em que possa proferi-las.

 

 Embarquei no rio das lágrimas que derramei por ti e naveguei na imensidão do sentimento que te sustenho. Desaguei na ternura que me agarra a ti e naufraguei na perda deste amor ausente.

Podia cair uma estrela, que eu estaria aqui para contigo poder abraçá-la. Podia abater o sol, que eu estaria aqui para contigo sentir o seu ardor. Podia ruir a terra, que eu estaria aqui para contigo construir um mundo novo. Podia acabar tudo o que existe que eu estaria aqui, à tua espera.

 

Nunca saberás o meu verdadeiro sentimento, aquele que nutro por ti. Resta-me esperar que o tempo permita que me liberte de ti, um dia.

Mais ninguém conseguirá preencher o lugar que te pertence.

Adoro-te a ti.

 

Tua até sempre

 

Laura'

 

por Leonor Teixeira, a Ametista

Porta aberta para um Sonho

 

Querido Duarte,

 

Às vezes, sinto-te chegar.

Abres a porta do meu mundo e entras nos meus sonhos devagar. Recolhes-me no teu colo e afagas os meus cabelos lentamente. As tuas mãos percorrem o meu rosto por entre carícias delicadas.

Em redor de nós, um vento brando onde as palavras não pairam. Nada consegue quebrar esta aragem que nos faz levitar.

Apertas-me docemente de encontro ao peito, envolves-me nos teus braços e dançamos num silêncio fiel que nos faz subir até à nuvem mais alta. Enlaçamo-nos por entre gestos de uma ternura quase transcendental.

Respiram-se os nossos sentidos, tocam-se as nossas almas.

É tudo tão suave.

Pára o tempo, acaba o mundo e permanecemos neste misto de amor e inocência.

É uma porta aberta para um sonho que se repete em cada pedaço das horas que vão passando por mim.

 

Tua até sempre.

 

Laura

 

por Leonor Teixeira, a Ametista

por: Leonor T, a Ametista

img1514942427922(1).jpgo outro lado do sótão

queres entrar?

os meus livros queres comprar?

ametistaleonor

ametistaleonor

não copie ou altere; respeite os direitos de autor

índice.jpg

comentários arrecadados

  • Ametista

    Querido Cúmplice, Obrigada por passares pelo meu s...

  • cumplicedotempo

    De acordo com tudo o que disseste, e mais encantad...

  • Ametista

    Querida Green,Obrigada por passares por aqui.. É s...

  • green.eyes

    Querida Leonor,É sempre um prazer ler um texto teu...

  • Ametista

    Obrigada.. desculpe o tardio da resposta. Sabe? Já...

esconderijos do sótão

  1. 2023
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2022
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2021
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2020
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2019
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2018
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2017
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2016
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D
  105. 2015
  106. J
  107. F
  108. M
  109. A
  110. M
  111. J
  112. J
  113. A
  114. S
  115. O
  116. N
  117. D
  118. 2014
  119. J
  120. F
  121. M
  122. A
  123. M
  124. J
  125. J
  126. A
  127. S
  128. O
  129. N
  130. D
  131. 2013
  132. J
  133. F
  134. M
  135. A
  136. M
  137. J
  138. J
  139. A
  140. S
  141. O
  142. N
  143. D
  144. 2012
  145. J
  146. F
  147. M
  148. A
  149. M
  150. J
  151. J
  152. A
  153. S
  154. O
  155. N
  156. D
  157. 2011
  158. J
  159. F
  160. M
  161. A
  162. M
  163. J
  164. J
  165. A
  166. S
  167. O
  168. N
  169. D
  170. 2010
  171. J
  172. F
  173. M
  174. A
  175. M
  176. J
  177. J
  178. A
  179. S
  180. O
  181. N
  182. D
  183. 2009
  184. J
  185. F
  186. M
  187. A
  188. M
  189. J
  190. J
  191. A
  192. S
  193. O
  194. N
  195. D
  196. 2008
  197. J
  198. F
  199. M
  200. A
  201. M
  202. J
  203. J
  204. A
  205. S
  206. O
  207. N
  208. D
  209. 2007
  210. J
  211. F
  212. M
  213. A
  214. M
  215. J
  216. J
  217. A
  218. S
  219. O
  220. N
  221. D

IMG_20151228_150612.JPG